Dan Halter
Dan Halter nasceu em Harare, capital do Zimbábue, pequeno país africano que apenas em 1980 deixou de ser colônia britânica. Em 2005, assistiu ao forçado exílio de seus pais – a reforma agrária proposta pelo presidente Robert Mugabe entrava em nova fase. Os latifundiários brancos foram sistematicamente afugentados pelo governo e pela população com o objetivo de alterar o equilíbrio étnico da propriedade de terra. Halter vive na África do Sul desde então.
Canal VB: Dan Halter discute trabalhos a partir de sua condição de imigrante
“Não escolhi fazer parte de uma minoria de brancos privilegiados num país africano prestes a sofrer mudanças radicais. Questões de direitos raciais e vantagens sobre a maioria local não tinham e não têm solução e constituem um desafio ético e moral. Venho lidando com isto a vida toda. Mas isso me dá todos os elementos para uma história interessante que me sinto compelido a contar, não importando se minha voz será considerada legítima”, afirma em depoimento para a PLATAFORMA:VB. Em entrevista a Ralph Borland disponível no FF>>Dossier 042, Halter menciona o importante passo que deve ser dado pelos revolucionários que lutaram contra a repressão e, hoje no poder, também são corrompidos: “é compreensível que a corrupção e o crime tenham aparecido, já que estão tomando de volta o que lhes foi negado por um longo tempo”. Apesar de fisicamente afastado, Dan Halter continua a questionar a política do Zimbábue pós-colonial através de seu trabalho.
O ano de 1991 fundamenta Untitled (Zimbabwean Queen of Rave). O vídeo alterna as comuns cenas de raves em países europeus e de manifestações pelo fim do Apartheid na África do Sul. Estas realidades contemporâneas e inteiramente opostas são amalgamadas pela dance music “Everybody’s Free (To Feel Good)” (todos são livres para se sentir bem), sucesso da cantora zimbabuana Rozalla. Os paralelos existem: a massiva concentração de pessoas reunidas por um mesmo interesse, a movimentação permanente, o clima de exaltação, as ruas tomadas. O termo inglês rave, além de designar as festas de música eletrônica ao ar livre, pode ser compreendido como “mover ou avançar violentamente”. As diferenças, por outro lado, são gritantes: os jovens brancos têm o privilégio de se encontrar para celebrar, enquanto os negros, de todas as idades, precisam se unir para reivindicar os mais básicos direitos humanos. A obra de Dan Halter denuncia que alguns são mais livres do que outros.
Untitled (Zimbabwean Queen of Rave) se assemelha a um videoclipe ou, como assinala o curador independente João Laia em texto publicado no livro de Memórias Inapagáveis, sua edição dinâmica “lembra os scratch videos ingleses dos anos oitenta onde se introduziu a apropriação de diferentes arquivos misturados utilizando o ritmo de músicas populares”. A simples sobreposição de cenas, típica baixa tecnologia, foi propositalmente utilizada pelo artista, que entende que a necessidade da “bricolagem” nos objetos culturais do Sul Geopolítico nasceu da pobreza da região e é legado da exploração. Ainda assim, considera a possibilidade do “faça-você-mesmo” uma ferramenta empoderadora.
Seu trabalho recente aborda a xenofobia dirigida aos refugiados do Zimbábue vivendo na África do Sul. Beitbridge Moonwalk (2010), vídeo que faz parte do Acervo Videobrasil desde a 17ª edição do Festival, é inspirado pelo relato de um imigrante que cruza ilegalmente a fronteira entre esses países. O crescente reconhecimento da obra de Dan Halter resultou na participação na 10º Bienal de Havana (Cuba), na 3ª Trienal de Guangzhou (China), na 9ª Bienal de Arte Contemporânea Africana (Dacar, Senegal) e em exposição do Smithsonian National Museum (Washington, EUA).
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