Associação Cultural Videobrasil

Com participação da atriz e ilustradora Rita Carelli, da escritora Maria Elisa Cevasco e do sociólogo Walter Mignolo (por Skype), a terceira sessão do Observatório do Sul teve como tema central a noção de “Geopolíticas do Conhecimento”. Ao tomar o termo emprestado das discussões do coletivo Modernidade/Colonialidade (M/C), constituído no final dos anos 1990 por um grupo de intelectuais latino-americanos, o encontro se propôs a entender a natureza das disputas históricas e políticas que se escondem por trás dos saberes naturalizados.

É possível que a ciência e o conhecimento de matriz ocidental possam coexistir horizontalmente com outras formas de se entender o mundo? Como construir diálogos com agentes e interlocutores não legitimados por instituições formais? Ou, ainda, como erodir os muros e estruturas institucionais que contêm o nosso pensamento? Essas questões atravessaram os debates precedentes do Observatório e foram o ponto de partida para que o grupo pudesse articular as perspectivas trazidas pelas produções práticas e teóricas dos convidados

O vídeo A Arca dos Z'oé (1993) abriu o encontro lançando luz sobre o trabalho do cineasta e indigenista Vincent Carelli e o seu projeto Vídeo nas Aldeias (VNA). A obra foi exibida em São Paulo na exposição Memórias Inapagáveis – um olhar histórico no Acervo Videobrasil, inaugurada em 2014, no Sesc Pompeia, que segue em itinerância internacional em 2015 e 2016. Parte da trilogia composta pelas obras O Espírito da TV (1990) e Eu já fui seu Irmão (1993), o trabalho realizado por Carelli, em parceria com a antropóloga Dominique Gallois, mostra a visita dos índios da tribo Waiãpi à aldeia dos índios Zoé, no interior do Pará. Segundo Rita Carelli, que desde muito cedo acompanhou a realização desses filmes, a obra revela a potência das ferramentas audiovisuais como forma de colocar em xeque os olhares que reduzem o lugar do índio contemporâneo à mímica de um passado idealizado e imutável. Rita também apresentou ao grupo a coleção de livros infantis Um dia na aldeia, publicada pela Cosac Naify. Editada sob a sua coordenação, a coleção retoma, em seis livros, histórias narradas por diferentes povos indígenas do Brasil.

A segunda parte do encontro foi palco de um acirrado debate acerca das perspectivas teóricas trazidas por Walter Mignolo e Maria Elisa Cevasco. Ao discutir as disputas geopolíticas que marcam o conhecimento eurocêntrico, Mignolo propôs uma crítica ao campo das ciências sociais trazendo ao debate a noção de “giro decolonial” ou decolonial turn. Originalmente cunhado pelo porto-riquenho Nelson Maldonado-Torres, em 2005, o termo retoma um “movimento de resistência teórico e prático, político e epistemológico” (Ballestrin, 2013) à lógica das ideias postuladas pelo coletivo Modernidade/Colonialidade.

Por fim, Maria Elisa Cevasco, autora do livro Dez Lições Sobre os Estudos Culturais (2003), discutiu diferentes definições de cultura à luz das contribuições do inglês Raymond Williams para a disciplina de Estudos Culturais. Sua fala tocou em pontos importantes para se pensar as terminologias utilizadas por aqueles que trabalham com arte e cultura, e chamou atenção para a necessidade de se restituir historicidade ao nosso léxico cotidiano.

Links e referências:

BALLESTRIN, Luciana. América Latina e o giro decolonial. Rev. Bras. Ciênc. Polít. [online]. 2013, n.11, pp. 89-117.

CEVASCO, Maria Eliza. As Dez Lições Sobre os Estudos Culturais. São Paulo: Boitempo Editorial, 2003.

Decolonial Aesthetics Manifesto, coletivo M/C Modernidade/Colonialidade

VÍDEO NAS ALDEIAS. Cineastas Indígenas para Jovens e Crianças. Olinda: Unesco, 2013.

VÍDEO NAS ALDEIAS. Cineastas Indígenas, Um outro olhar. Olinda, 2010.

VÍDEO NAS ALDEIAS. Canal Youtube. 

Coleção Um dia na aldeia, coordenada por Rita Carelli