Arte para tempos instáveis
A partir do dia 3 de outubro, a cidade de São Paulo será palco de debates acerca da produção cultural do Sul Global em meio ao 20º Festival de Arte Contemporânea Sesc_Videobrasil, que nesta edição espelha, de modo panorâmico e poético, as inúmeras crises que têm desafiado a sociedade contemporânea. Além da exposição dos trabalhos selecionados, o Festival também será marcado por performances e programas públicos que, juntos, ocuparão diversos espaços do Sesc Pompeia até janeiro de 2018.
Para o diretor regional do Sesc São Paulo, Danilo Santos de Miranda, “o 20º Festival de Arte Contemporânea Sesc_Videobrasil, com propostas de artistas provenientes de diferentes nações do Sul geopolítico, situa-se numa encruzilhada na qual o específico e o geral se encontram. Sob essa premissa, o Sesc realiza uma ação cultural afeita a experiências dedicadas a desfazer as amarras herdadas do passado colonial e contraídas de uma condição geopolítica periférica”. Miranda menciona a importância da parceria entre o Sesc e a Associação Cultural Videobrasil que, desde os anos 1990, “possibilita que esses cruzamentos entre as linhas de força locais e internacionais resultem na invenção de outros nós a partir do Sul”.
“Nestes tempos instáveis, quando disputas narrativas se acirram e reordenamentos sociopolíticos locais e globais tornam-se constantes, sempre sob o fantasma permanente de crise – econômica, ecológica ou cultural –, o conjunto de artistas selecionados traz à tona o desejo da arte em ampliar nossas concepções de mundo, englobando o estudo da vida, de nossas origens, da evolução do universo, das dinâmicas de grupos sociais ao longo da história, bem como da invenção de novas formas de fazer político”, afirma Solange Farkas, curadora-geral do Festival e diretora do Videobrasil, entidade que, ao lado do Sesc São Paulo, assina a realização do evento.
“São práticas artísticas que borram as fronteiras entre as ciências e nos levam numa viagem sobre a origem da história, das sociedades e da Terra”, completa Solange.
MOSTRA
Também focado na representatividade geopolítica da arte, o 20º Festival selecionou, para esta edição, trabalhos de 50 artistas, oriundos de 25 países. Desse total, 15 são brasileiros. Há ainda representantes da América Latina, África, Ásia e do Oriente Médio. Solange Farkas assina a curadoria-geral desta edição, ao lado de quatro curadores convidados: os brasileiros Ana Pato, Beatriz Lemos e Diego Matos, e o português João Laia. Juntos, os curadores analisaram aproximadamente 3.200 trabalhos, inscritos por 2 mil artistas, de 109 países.
A mostra do Festival traz vídeos, pinturas, instalações, esculturas, fotografias, gravuras e até mesmo plantas artificiais que formam um pequeno jardim de aclimatação. São trabalhos diversos que revelam uma multiplicidade de visões de mundo, criadas a partir de uma sociedade que parece pressentir seu próprio fim e, para evitá-lo, recorre a suas origens.
“O espectro de observação do artista ganha alterações diversas de escala diante do lugar que o cerca: dos micro-organismos até o âmbito do cosmos, das ações no campo da micropolítica às mobilizações em massa. As vozes simbolicamente vindas de outros lugares de partida que antes estavam à margem agora procuram qualificar uma nova ordem, diversa ao império moderno, às grandes narrativas históricas que deixaram um legado traumático e ao cientificismo de outra hora que nos fez crer na onipotência do homem e sua tecnologia”, destacam os curadores.
As obras foram organizadas de acordo com seis eixos: Cosmovisões (Origens; Ritos e Cosmogonias; Ciências e Cosmologias); Ecologias (Natureza, Terra e Fungos; Catástrofes, Crises e Novas Consciências); Reinvenção da Cultura (Técnicas, Apropriações e Representações); Políticas de Resistência (Urbanidade, Corpos e Afetos); Histórias Invisíveis (Memória e Micro-história); e, por fim, Outros Modernismos (Outros Espaços e Outras Paisagens).
Frame de Cautivos, de Felipe Esparza Pérez
EXPOGRAFIA
Em 2017, o Sesc Pompeia reunirá todas as atividades do Festival. Antes concentrada na área de Convivência do local, a exposição tomará não só este espaço, mas também o Hall do Teatro e as ruas internas – vias que cortam o equipamento cultural e as Oficinas. Será construído um Auditório, que receberá ainda os Programas de Vídeos, mostras montadas com obras que exigem exibição em sala de cinema.
O projeto expográfico do 20º Festival é assinado pelo arquiteto André Vainer. A direção de arte, assim como o projeto gráfico da edição, é de autoria de Vitor César, arquiteto e artista que possui um trabalho de pesquisa sobre noções de espaço público em práticas artísticas.
Além da exposição propriamente dita e do programa de vídeo, a programação do 20º Festival conta ainda com Performances, atividades de Programas Públicos (como encontros e conversas com participantes do Festival) e Oficinas, além de ações educacionais para grupos e famílias, coordenadas pela arte-educadora Vera Barros. Estão previstas ainda visitas mediadas por curadores e convidados.
CATÁLOGO ENCICLOPÉDICO
Com um projeto gráfico que recria elementos tradicionais das enciclopédias, servindo-se não só de textos, mas também de imagens, ilustrações, mapas e gráficos, o catálogo do 20º Festival amplia o contato do público com o contexto e os conceitos articulados pelas obras selecionadas, convidando o público a repensar criticamente as disciplinas e as categorias que vêm normalizando as formas de experimentar e compreender o mundo.
Integrando arte, cultura, astronomia, biologia, história e geografia, de modo a tornar ainda mais evidente o rompimento das fronteiras entre arte e ciência, o catálogo enciclopédico lista, em ordem alfabética, os artistas e suas obras, intercalando-os com outros tipos de verbetes, designados como “palavras-chave”, “países” e “regiões” de origem e residência dos autores – verbetes estes que conceituam o Sul geopolítico e sua produção.
Frame de Contornos, de Ximena Garrido-Lecca
PREMIAÇÃO
Nesta 20ª edição, o Festival oferecerá aos artistas participantes do Brasil e do exterior três Prêmios de Aquisição, no valor de R$ 25 mil cada, para as obras em vídeo que passarão a integrar o Acervo Sesc de Arte.
A fundação Ostrovsky Family Fund (O.F.F.), reconhecida pelo incentivo a iniciativas artísticas progressistas e independentes, oferecerá a um dos selecionados um prêmio no valor de R$ 25 mil para o trabalho de arte com imagem em movimento mais inovador. O reconhecimento será atribuído pelo próprio júri de premiação do Festival.
Serão ainda concedidos cinco prêmios de residências artísticas, cada um deles oferecido por um júri internacional específico, de instituições parceiras do Festival. São elas Ujazdowski Castle Centre for Contemporary Art, da Polônia; Kyoto Art Center, do Japão; Residência Vila Sul, do Goethe-Institut, em Salvador, Bahia; Wexner Center for the Arts, dos Estados Unidos; e a Pro Helvetia, da Suíça. Os artistas premiados serão anunciados no dia 8 de outubro, em cerimônia no Teatro Sesc Pompeia.
Neste ano, Flávia Ribeiro assina a escultura-troféu destinada aos artistas premiados pelo 20º Festival de Arte Contemporânea Sesc_Videobrasil. Convidada, a artista plástica concebeu uma peça que, em sua visão, sintetiza o valor da diversidade cultural tão presente no Festival. Nesta edição, o troféu ganha forma de um pequeno pássaro, criado em bronze banhado a ouro, acrescido de veludo. “As aves migram, voam muitas vezes de um país a outro, percorrendo longas distâncias. Relaciono isso ao fato de o Festival receber obras e artistas de várias partes do mundo, um trânsito entre culturas tão diversas”, afirma Flávia.
Autora de uma obra que contempla pesquisas no campo da escultura, gravura e livros de artista, Flávia tem no desenho o impulso para sua criação. Para a artista, é por meio desta linguagem técnica específica que são elaboradas questões a serem investigadas no processo de seu trabalho.
Com a criação do troféu para a 20ª edição do Festival, a artista se une ao seleto grupo de figuras que conceberam a peça em edições anteriores, tais como Efrain Almeida, Tunga, Rosângela Rennó, Luiz Zerbini e Erika Verzutti, entre outros.